sábado, 30 de outubro de 2010

Capítulo 2 - Coisa de irmãs

Ao contrário do que sou acostumada a fazer, assisti a minha entrevista, no horário nobre. Fiquei contente de ter dado tudo certo, porém, aquele desconforto continuou, e isso me deixou preocupada. Heitor parecia arrogante naquela entrevista, mas ele era um cara legal. Ele estava diferente, ainda lindo, mas diferente. Liguei para a minha irmã mais nova, fanática por ele, para saber o que ela achava de tudo isso:

- Ele continua lindo – Inês riu do outro lado da linha – Nossa, Carol! Nem pra você pegar um autógrafo pra mim!
- Inês... – eu disse – Você tem 18 anos!
- E qual o problema? – ela perguntou.

“Qual é o problema?” Eu pensei. Ela tinha 18 anos e vivia pela banda. Ela é o tipo de pessoa que gasta horrores para fundar um fã-clube do Heitor Purgatto, ir aos shows e obter informações sobre ele. Não sei como, nem por quê, mas ela faz isso.

- Tudo bem. Eu peço, quando e se encontrá-lo.
- Quando vai ser?
- Não sei. Acho que não o verei. – parei e prossegui – se bem que ele me... – ri sozinha – deixa pra lá.
- Como? Me conte tudo e não me esconda nada! – Inês gritou.
- Inês – comecei – O que você acha que alguém quer dizer com: Vou pensar em alguma coisa para compensar?
- Ele te disse isso? – ela continuava gritando – Por quê? O que você disse antes pra ele?
- Eu disse que nem sabia como agradecer – engasguei – pela entrevista.

Ela analisou o que eu havia dito e concluiu:
- Ele vai te chamar pra sair! – ela enciumou-se.
- Claro que não! – eu gritei – Ele só tentou me dar alguma esperança! Coisa de gente famosa.
- E conseguiu... – ela provocou – relaxa queridinha, ele vai te procurar. Se não procurar, eu dou um jeito.
- Que jeito? – perguntei, já irada.
- Você ainda vai voltar a entrevistá-lo, pode apostar. – ela riu.
- Ah, você não vai fazer isso não! – gritei
- Claro que vou, e você acha que eu vou perder essa? Assim que eu tiver a informação certa, vou ligar na TV sugerindo uma matéria pra você! – ela finalizou a conversa, desligando na minha cara.

Fiquei xingando minha irmã pela casa inteira. A não ser que ela tenha algo realmente bom para contar na redação da tevê, uma sugestão qualquer dela não surtiria efeito. Porém, seu convencimento foi tanto, que eu acabei gostando da ideia de prolongar a entrevista com ele.

Fiquei ouvindo as músicas do The Finalap até tarde da noite. A Carol insuportável, e aquela bendita frase não estavam me deixando dormir. Não aguentei por muito tempo e acabai indo ver o blog da Inês, que, detalhe, era o blog do fã-clube da banda. Acabei descobrindo o porque do nome da banda.

“Na Fórmula 1, é de costume assistir somente a largada e as últimas voltas da corrida. Isso acontece porque só queremos saber quem saiu primeiro e quem chegou primeiro. É o significado da vida para Heitor, cantor da banda The finalap. Muitas vezes, ninguém se importa com que rumo a vida toma, o que realmente parece importar é se alguém conseguiu algo e como vai perdê-lo. ‘Se Fulano ganhou na loteria ao invés de você, o dinheiro se torna tão significante que você deseja que ele seja roubado, que ele gaste tudo sem planejamento, e, em alguns casos, que ele suma para não ser assassinado’, disse ele, em uma entrevista ao nosso fã-clube.”

A banda poderia ser bem mais interessante do que imaginei. Ele pensava como eu.

Em meio ao silêncio comum em minha casa ouvi Thor latir desesperadamente. Ele é um Rhodesian Ridgeback, e estava na minha cozinha. Levantei-me, coloquei a pantufa e saí atrás dele. Ele nunca havia latido dessa forma e me deixou preocupada. Thor tem um ano, fofíssimo. Ele usa um pingente na coleira em forma de martelo, com seu nome e o meu telefone grifados. Ele é um anjo, nunca fez mal a ninguém. Do tipo que passeia sem corrente, ao meu lado. Companheiro de todas as horas, Thor sabe tudo que sinto.
Desci as escadas e encontrei Thor acuado, ele olhava fixamente em direção à janela da cozinha, pela porta:
- ‘Xiiiu’ Thor. O que houve?
Ele me olhou torto, tampando a passagem.
- Sai pra lá, me deixa ver – empurrei levemente, e ele não parou de latir, nem ao menos abriu espaço.
Não tive outra escolha a não ser pular por cima de Thor, para entrar na cozinha.

Thor parou de latir e meu coração acelerou. O que quer que fosse, estava fora da minha casa. Quando subi para o escritório, deixei a janela trancada. Assim que entrei, Thor me acompanhou em silêncio e levantou as orelhas com o que acabara de ver.
Tudo aparentemente normal. A janela estava fechada e a cozinha vazia.
Uma estranha movimentação acontecia do lado de fora de casa, porém, as luzes alaranjadas que iluminavam a rua não me deixavam revelar o que estava acontecendo. Talvez o vento movimentasse os galhos das árvores e causasse essa ilusão de ótica, mas eu tinha certeza que havia algo a mais.
Aproximei as mãos da janela, ela parecia congelada. Quando a toquei para abrir, Thor latiu outra vez, alertando-me do que estava prestes a fazer. Respirei duas, três vezes e, confrontando as vontades de Thor, que começava a rosnar, abri a janela. Ele não me atacaria, pensei, virando para observá-lo.
Pensei errado. Ele ainda rosnava pra mim, aproximando-se lentamente. Eu tentei me afastar, mas não sabia o que fazer:
- Thor? – chamei-o assustada, mas ele não me ouviu – Thor! Para com isso – supliquei, vendo-o se aproximar mais.

De acordo com que eu tentava me afastar, esbarrando nos armários e encostando o máximo possível nas paredes, Thor se direcionou para outro lado, não mais para mim. Não sei o que o fez agir assim, mas ele estava fugindo de mim, e pulou a janela.
No mesmo momento, corri até a janela e vi que a movimentação não era causa do vento, mas sim de algo estranho, o qual Thor estava correndo atrás. Num ato de desespero, tranquei a janela e saí de casa atrás dele.
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Leia o terceiro capítulo aqui.


Todos os textos escritos sao de autoria de Gisela Santana. Por favor divulguem, mas com os necessarios meritos.

Um comentário:

  1. Hahaha! Eu tinha certeza de já ter lido esse capítulo, e comentado, inclusive. Depois que percebi, lembrei do que li no post inicial do capítulo anterior, você o dividiu em dois. Mas foi bom tê-lo relido, só então compreendi o que Heitor disse a respeito do prêmio de loteria. Juro ter pensado que você extraiu esse texto de algum lugar da net.

    Parabéns, ficou muito bom mesmo!

    <><<



    Beijos!

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